terça-feira, 24 de novembro de 2009

De volta

Depois de algum tempo sem colocar nada novo aqui, estou de volta. E só pra animar, vai um conto que escrevi para uma disciplina na faculdade:

A noite estava escura

A noite estava escura. O vento gelado fustigava o rosto de Timo Cruz. O rapaz estava a espera de uma encomenda, em pé em uma esquina. Ele podia ouvir o som das sirenes rugindo à distância. Estariam atrás dele? Teriam pegado seu primo? Não sabia. Não tinha como saber. Só o que ele podia fazer era continuar ali em pé, esperando.

A cidade era outra durante a noite. Toda uma laia de seres estranhos e suspeitos saía às ruas e dominava os bares e clubes. Ele era um desses seres, um desses animais notívagos sedentos por uma nova dose. Não. Ele era um desses animais fornecedores de doses: ele era um provedor. Pessoas dos mais variados tipos vinham procurá-lo, pessoas necessitadas. E ele as ajudava. No final das contas, ele fazia um favor à sociedade. Não sem uma pequena contribuição, é lógico. As pessoas precisavam entender que nada é de graça, e que muitas vezes se paga com o próprio sangue. Timo Cruz sabia muito bem disso. Ele já presenciara alguns desses pagamentos. Terríveis, terríveis! Só de pensar no estampido do revólver e na massa vermelha nojenta que se espalha pelo chão logo após Timo Cruz tremia. Ele apalpou disfarçadamente a arma que trazia presa na calça. Sentiu o metal frio e imaginou aquele frio tocando sua nuca. Tremeu de novo. Decidiu pensar em outras coisas.

Foi então que Timo Cruz viu pela janela de um barzinho seus antigos amigos do time de basquete. Eles estavam festejando, juntos, felizes, alegres, a mesma turma de quando ele ainda fazia parte do time. Como ele queria voltar ao time! Seria tão bom estar novamente com seus amigos, jogar em campeonatos, ganhar uns troféus, fazer sucesso com as garotas... mas isso era passado. Depois de se desentender com o treinador novo, jamais ele poderia retornar. Aquele treinador era um carrasco imbecil. Não, Timo Cruz não se submeteria àquilo. Ele era melhor que aquilo. Ele já sabia se cuidar, já ganhava sua própria grana e já empunhava sua própria arma. Timo Cruz era um homem, ele não precisava estar em nenhum time de basquete de merda. No entanto, ao ver seus amigos se divertindo, o rapaz sentiu um nó na garganta. Ele sentia saudade. Ele sentia que daria tudo, sua grana, sua arma, inclusive sua virilidade, para estar de volta àquele grupo. O mundo é um lugar perigoso e no time Timo Cruz encontraria segurança. Talvez encontrasse inclusive um futuro. Se ao menos o treinador novo não fosse tão rigoroso... talvez lhe desse uma nova chance para voltar ao time! Mas isso era impossível. Depois da briga e da cena que fizera no ginásio jamais ele seria readmitido. O novo treinador não queria saber de perdedores. E Timo Cruz era um perdedor. O rapaz abaixou a cabeça, triste. Sabia que seu futuro era sombrio e que talvez nem houvesse futuro para ele, sabia que talvez dali a cinco minutos seria baleado pela gangue rival, sabia que a qualquer momento poderia se tornar uma réles gosma vermelha e nojenta no asfalto sujo da cidade.

O seu primo estava atrasado. Será que algo teria acontecido? Só o que Timo Cruz queria era atenção e incentivo. Será que a polícia o tería encontrado? Timo Cruz só precisava de alguém que acreditasse em seu potencial. Será que a gangue rival o teria matado? Mas que potencial? Timo Cruz não tinha potencial. Ele era apenas um bandidinho de bosta. Que potencial poderia ter? Seu primo estava atrasado e começando a preocupá-lo. Mas ainda assim... se alguém, se qualquer um o fizesse enxergar o quão longe ele poderia ir, o quão perto estavam seus sonhos de se realizarem... se qualquer um tivesse acreditado nele... talvez ele fosse outro, talvez não fosse Timo Cruz, talvez fosse um bom aluno, talvez fosse um bom filho, um bom amigo, uma boa pessoa. Talvez. Mas o primo logo chegou. E como talvez não é certeza, Timo Cruz pegou com ele a encomenda e saiu a vagar pela noite escura, perdido, triste e só.


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